por Solange Lemaitre em O Hinduísmo (1958), Editora Flamboyant, São Paulo.
Escola Vaisesika
Extremamente antigo, o Vaisesika só se formulou em sistema a partir dos sutras que lhe são consagrados. A finalidade desse darchana é pôr termo à dor dos seres, dando-lhes a visão direta, isto é, fazendo-lhes realizar o seu EU.
Ele faz distinção entre substâncias materiais e substâncias espirituais, e descreve, delimitando em suas particularidades, os elementos da Natureza, ou prákriti. Pode-se considerá-lo como uma física. Ele se aproxima do Nyaya, outro darchana.
Para o Vaisesika os corpos materiais se compõem de átomos infinitamente pequenos, eternos e indestrutíveis, animados por uma força invisível, os quais se combinam segundo leis próprias para formarem moléculas binárias, terciárias, quaternárias, até a composição dos corpos materiais, etc. A essas combinações de átomos ajuntam-se inumeráveis átmans, ligados ao mundo fenomenal, e conseqüentemente ao círculo do sansara. Os átomos banham-se continuamente no akaça, ou éter espacial. O átomo é definido "como sendo da ordem de grandeza da sexta parte do grão de poeira visível num raio de sol (id. Renou, pág. 73). Cada átman tem um manas pelo qual ele percebe o universo e se une intimamente a ele. A causa do determinismo que o prende à transmigração vem dessa união contraída com a matéria. Para o conhecimento de sua natureza real, o átman se liberta. É a ruptura com o sansara.
Os autores do Vaisesika descrevem as nove substâncias de que se compõe o Universo: a terra (prihtivi), as águas (apas), o fogo (tejas), o ar (vayu), o éter (akaça), o tempo (kala), a direção espacial (diç), a alma (átman), o espírito ou entendimento (manas). Os gunas são as qualidades das substâncias. Eles caracterizam as substâncias em suas atividades ou em suas propriedades. É preciso notar que o éter não é atômico, mas o meio de propagação do som. "É a vontade divina e o carma que, segundo uma parte dos autores do Vaisesika, combinam e dissociam os átomos para criar e destruir o universo" (id Renou, pág.73). Os autores do Vaisesika definem o dharma como sendo o meio pelo qual se chega ao cume do mais alto desenvolvimento. Esse sistema filosófico conduz praticamente à libertação por uma reforma intelectual fundada sobre uma classificação metódica dos valores. Ele estabelece uma distinção capital entre o manas, espírito ou entendimento, e a alma. Ao contrário do átman, o manas não é universal mas atômico. Enquanto que o átman abraça o mundo, o manas, se bem que espiritual, permanece ligado ao plano da personalidade pensante. Os Vaisheshita-sutras são atribuídos a Kaneda.
O átman é o ponto central do darchana. Sua evidência manifesta-se em todos os fenômenos biológicos e psicológicos. "O ritmo da vida, o movimento do espírito, as sensações, os sentimentos e as volições, tudo é prova da existência do átman”. Parece que a mais antiga obra importante vaisesika, em seqüência aos Sutras, é o Padharthadahrmasamgraha, devido a Prasastapada [Grousset, Philosophies indiennes, II pág. 74].
Escola Nyaya
O termo Nyaya tem propriamente o sentido de "lógica". O Nyaya é um darchana atribuído a Akchapada Gautama, que trata principalmente da lógica tomada numa concepção menos restrita que no Ocidente. Esta lógica é concebida como um "ponto de vista" da doutrina total, o que amplia o seu alcance.
Nyaya pode ainda ser definido como "uma pesquisa do espírito", um método de conhecimento filosófico, que considera as coisas "como objetos de prova" e classifica-as em categorias.
Os Nyaya-sutras, texto fundamental do Nyaya, distinguem dezesseis elementos das operações da inteligência, ou "padharta"; o primeiro desses elementos se chama: "prâmana", que quer dizer "prova" ou "medida, critério". O segundo "prameya", indica o que pode ser medido, o mensurável. Ele tem como subdivsões uma classificação de todas as coisas que o entendimento humano pode atingir.
O Nyaya que se prende ao Vaisesika, cujos sutras são anteriores aos seus, emprega uma forma particular de raciocínio, uma espécie de silogismo. Esse raciocínio aplica-se também ao domínio espiritual e pode conduzir à Libertação, que se obtém - segundo os hindus - pelo conhecimento perfeito.
O sutra inicial declara que o "conhecimento dos dezesseis elementos da dialética permite o acesso ao soberano bem". Por uma série de raciocínios lógicos que se encadeiam, os nyaya-sutras chegam à conclusão de que o infortúnio da existência é causado pela ignorância, pelo falso conhecimento.
"O Nyaya ensina a raciocinar com justeza sobre os fenômenos cuja existência ele reconhece. A esse respeito, ele é um instrumento da ciência, indispensável no estabelecimento das teorias que ela ensina; eis porque ele é utilizado pela medicina e descrito por Saraka."
[L. Renou, ib.]
O Nyaya reconhece a existência de um deus supremo: Ichvara. Mas a teologia não é sua finalidade.
"O teísmo do Nyaya reveste-se de importância particular no século x, em Udayana (seu comentador), cuja obra é qualificada por Barth como uma das mais religiosas da literatura sânscrita. Não resta a menor dúvida de que o Nyaya, como sistema lógico, é aceitável para qualquer um, sem distinção de religião."
[L. Renou, ib.].
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